Sophia, minha mulher, planeja por em prática alguns
planos. É arquiteta, está sempre planejando algo. Eu, que parei de estudar
quando peguei a primeira cadeira de cálculo na faculdade de química,
contento-me em conseguir manter meu emprego de supervisor numa empresa privada
de auditoria. Monitoro as falhas de quem procura falhas alheias. Sempre envolto
em pilhas de pastas e rodeado por arquivos em uma sala três por três, às vezes
me pergunto se esta é realmente a vida que imaginei ter quando criança. Sonhava
em ser astronauta, ou cientista, ou qualquer outra coisa que não isso. Seria
esse o destino que futuro me reservara, desde que nasci?
Acabaram-se os dias de vadiagem por culpa exclusiva
da seleção, ainda que eu nem assistisse com muito afinco aqueles jogos. Como
ainda era sexta-feira, alguma coisa poderia ser feita para melhorar ao menos
meu final de semana. Sophia disse que iria preparar um prato especial para a
janta, tentando sossegar minha aparente tristeza, apesar da apatia que eu
tentava transparecer. Ela sabia que não era pela derrota no futebol que eu
estava triste, ou pelos dias a mais que precocemente haveria de trabalhar, mas
pela minha derrota na vida, os planos aleijados. Ela bem conhecia aquele meu
olhar. Convidou seu amigo e subchefe Filipe e a esposa, cujo nome não me recordo,
para um jantar a quatro. Não sei bem se para me alegrar ou para motivar, pois
Filipe era um alto executivo do ramo imobiliário, cheio da grana, bem vestido,
cheiroso e boa praça; ela, uma madame socialite cheia de apliques e silicones
que esbanjava o dinheiro do marido. Como competir com aquele carro importado
sendo o meu um popular financiado em perpétuas prestações?
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